CRÉDITOS DE COBRANÇA DUVIDOSA E CRÉDITOS INCOBRÁVEIS
Implicações fiscais
1. - Perdas por imparidade em dívidas a receber (créditos de cobrança duvidosa)
Determina o SNC na NCRF 27, que em cada data de relato a entidade deve avaliar a imparidade dos créditos sobre clientes. No caso de haver uma evidência objetiva de imparidade (§§ 24 e 25), a entidade deve reconhecer uma perda na demonstração de resultados.
Esta avaliação deve ser feita pelo órgão de gestão e deverá ter em conta a prévia existência de contactos infrutíferos com o cliente no sentido de cobrar as dívidas vencidas (com evidências), mas também a convicção fundada de que a sua cobrança é duvidosa.
- O reconhecimento das perdas por imparidade destas dívidas a receber de clientes deve ser avaliada em cada data de relato, ou seja, no final do período contabilístico.
- Este reconhecimento de perdas por imparidade é efetuado apenas se existir uma evidência objetiva de um evento de perda, como por exemplo:
- significativa dificuldade financeira do devedor;
- não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da dívida no prazo estabelecido contratualmente;
- Este procedimento depende de uma avaliação da situação do crédito em causa, pelos órgãos estatutários, que deverá apreciar se, de acordo com as informações que disponha, existe, ou não, risco que deva ser devidamente refletido, não sendo esta uma decisão do Contabilista Certificado, sem prejuízo do apoio que este possa oferecer nessa apreciação.
1.1. - IRC
O reconhecimento contabilístico destas perdas não lhes dá automática relevância fiscal em sede de IRC, essa deverá atender aos artigos 28.º-A e 28.º-B do CIRC, ou seja só serão reconhecidos fiscalmente quando disserem respeito à atividade normal da empresa, estejam reconhecidos na sua contabilidade e se encontrem enquadradas nos casos em que o risco de incobrabilidade se considera justificado:
A) O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo DL n.º 178/2012;
B) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;
C) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento, sendo aceites fiscalmente até aos seguintes limites anuais em relação ao total de créditos em mora, conforme o nº 2 do art.º 28.º-B do CIRC:
a) 25 % para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;
b) 50 % para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;
c) 75 % para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;
d) 100 % para créditos em mora há mais de 24 meses.
1.2. - IVA
As possibilidades de dedução de IVA relativa aos créditos de cobrança duvidosa estão definidas no artigo 78.º-A nº2 do CIVA :
A) O crédito esteja em mora há mais de 12 meses desde a data do respetivo vencimento, existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento;
B) O crédito esteja em mora há mais de 6 meses desde a data do respetivo vencimento, o valor do mesmo não seja superior a € 750, IVA incluído, e o devedor seja particular ou sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que não confiram direito à dedução.
No caso da alínea A) deverá ser submetido um pedido de autorização prévio à AT (por CCI se a regularização do IVA for inferior a €10.000 por Declaração Periódica, por ROC nas restantes situações) no prazo de 6 meses a contar do momento em que foi considerada a cobrança duvidosa (12 meses após o vencimento).
Tal como no IRC, caso não seja apresentado o pedido de autorização prévio nos termos do parágrafo anterior e não seja regularizado o IVA a que tinha direito, não poderá fazê-lo mais tarde quando o crédito se tornar incobrável. A regularização do IVA de créditos incobráveis, só será possível quando esta ocorra em momento anterior ao decurso dos prazos de mora exigidos para a regularização dos créditos de cobrança duvidosa. Como o prazo é de 6 meses para o pedido à AT, uma desatenção pode impossibilitar definitivamente a regularização do IVA.
Nos casos enquadráveis na alínea B) a dedução é efetuada diretamente pelo sujeito passivo até ao prazo de 2 anos a contar do 1º dia do ano civil seguinte, sem necessidade de pedido de autorização à AT.
2. - Créditos Incobráveis
2.1. - IRC
Para efeitos de IRC, é o artigo 41.º do CIRC, que estabelece o tratamento a dar aos créditos incobráveis, sendo fiscalmente aceites apenas nas situações definidas no ponto 1 deste artigo e desde que não tenha sido admitida perda por imparidade anterior ou esta se mostre insuficiente:
A) Em processo de execução (extinto e registado no Citius por não haver bens penhoráveis);
B) Em processo de insolvência de caráter limitado, ou quando for determinado o encerramento do processo por insuficiência de bens, ou após a realização do rateio final, do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito;
C) Em processo de insolvência ou em PER, quando seja proferida sentença de homologação do plano de insolvência ou do plano de recuperação que preveja o não pagamento definitivo do crédito;
D) (Revogada pela Lei n.º 8/2018, de 2 de março)
E) No âmbito de litígios emergentes da prestação de serviços públicos essenciais, após decisão arbitral;
F) Nos termos do regime jurídico da prestação de serviços públicos essenciais, os créditos se encontrem prescritos e o seu valor não ultrapasse o montante de € 750.
G) No Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) (celebração do acordo de que resulte o não pagamento definitivo do crédito).
Chama-se a atenção novamente para o facto de que o não reconhecimento atempado das perdas por imparidade dos créditos de cobrança duvidosa, impossibilitar o reconhecimento fiscal posterior do crédito incobrável.
2.2. - IVA
Tal como no IRC, caso não seja apresentado o pedido de autorização prévio nos termos do artigo 78.º-A do CIVA e não seja regularizado o IVA a que tinha direito, não poderá fazê-lo mais tarde quando o crédito se tornar incobrável.
A regularização do IVA de créditos incobráveis, só é possível quando esta ocorra em momento anterior ao decurso dos prazos de mora exigidos para a regularização dos créditos de cobrança duvidosa e nas situações seguintes:
A) Em processo de execução (extinto e registado no Citius por não haver bens penhoráveis);
B) Em processo de insolvência de caráter limitado, ou quando for determinado o encerramento do processo por insuficiência de bens, ou após a realização do rateio final, do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito;
C) Em processo de insolvência ou em PER, quando seja proferida sentença de homologação do plano de insolvência ou do plano de recuperação que preveja o não pagamento definitivo do crédito;
D) No Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) (celebração do acordo de que resulte o não pagamento definitivo do crédito).
Como o prazo é de 6 meses para o pedido à AT, uma desatenção pode impossibilitar definitivamente a regularização do IVA.
A regularização do IVA em créditos incobráveis nos processos de execução considera-se verificada na data do registo informático de extinção do processo, a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 717.º do Código do Processo Civil. Assim, para efeitos de regularização do IVA, para além da certificação de ROC e da comunicação da regularização ao devedor, o credor deve estar na posse de comprovativo de que a execução foi extinta por não terem sido encontrados bens penhoráveis. Este comprovativo pode ser uma certidão judicial passada para o efeito ou documento extraído do CITIUS, comprovativo da extinção da execução.
3. - Sugestão de procedimentos a adotar (empresários e gestores)
3.1. Os empresários e gestores devem:
a) desenvolver as diligências necessárias à cobrança dos créditos em mora;
b) garantir a existência de evidências neste processo de cobrança (cartas, emails, telefonemas, etc…);
c) em colaboração com o CC ou ROC, elaborar um mapa mensal de antiguidade dos créditos que permita:
- evidenciar os dias de atraso relativamente ao vencimento;
- assinalar os créditos que têm atraso superior a 6 meses e 12 meses;
d) comunicar ao devedor, que seja sujeito passivo de IVA, a anulação total ou parcial do imposto, para efeitos de retificação da dedução inicialmente efetuada, devendo esta comunicação identificar as faturas, o montante do crédito e do imposto a ser regularizado, o processo ou acordo em causa, bem como o período em que regularização é efetuada;
e) Imprimir e unir todas as evidências referidas na alínea b) do 3.1. deste tema ao mapa descrito na alínea c) do 3.1., devendo o mapa ficar nas primeiras páginas do agrupamento;
f) Para as empresas com Contabilidade Digital e na sequência acima referida, digitalizar todo o processo definido na alínea e) do 3.1..
3.2. Informar os Contabilistas Certificados ou Revisores Oficiais de Conta sempre que:
a) passem a considerar um crédito de cobrança duvidosa;
b) os créditos estejam em mora há mais de 6 meses e há mais de 12 meses desde a data de vencimento;
c) reclamem créditos judicialmente ou em tribunal arbitral.
3.3. Informar os Contabilistas Certificados ou Revisores Oficiais de Conta sempre que tenham conhecimento ou sejam notificados relativamente a créditos que possuam de devedores em:
a) processo de insolvência;
b) processo especial de revitalização (PER);
c) procedimento de recuperação de empresas (SIREVE);
d) regime extrajudicial de recuperação de empresas (RERE).
4 - Certificação dos créditos de cobrança duvidosa e incobráveis
4.1. - Como medida de apoio às empresas, no sentido de permitir a agilização do processo, foi introduzida pela lei do OE 2021 a possibilidade da certificação poder ser efetuada por (CCI) Contabilistas Certificados Independentes, quando o montante de imposto a regularizar não exceda os €10.000 por pedido de autorização prévia, tendo-lhe sido afeta uma natureza interpretativa (anteriormente era por declaração periódica), acima do qual era feita em exclusivo pelos revisores oficiais de contas (ROC).
4.2. - Importa ressalvar que, atendendo ao seu caráter urgente, o SEAAF emitiu o Despacho 452/2020.XXII, nos termos do qual prevê a aplicação imediata da regra supramencionada, nas situações anteriores à data da entrada em vigor do mesmo. Relativamente aos créditos incobráveis, tal certificação é igualmente aplicável nos mesmos termos, contudo, neste caso, não existe qualquer valor limite.
4.3. - O conceito de CC independente não se encontra previsto no CIVA, não obstante, para efeitos da Portaria n.º 303/2020, de 28 de dezembro, considera-se enquanto tal, aquele que não seja responsável pelas obrigações contabilísticas e fiscais do sujeito passivo e cujo exercício de funções, seja efetuado a título independente. Acresce ainda que o CC não pode ser membro dos órgãos sociais, administração, direção, gerência ou fiscalização, nem detentor direto ou indireto de capital ou partes sociais, e, para finalizar, é igualmente necessário que não possua relações especiais com o sujeito passivo.
4.4. - Adicionalmente, note-se que esta certificação deverá ser efetuada para cada um dos documentos e períodos a que se refere a regularização e até à entrega do correspondente pedido (a apresentar no prazo de doze meses, contados a partir da data em que os créditos sejam considerados de cobrança duvidosa), sob pena do mesmo não se considerar apresentado. Por outro lado, no caso da regularização dos créditos não depender do mesmo, a certificação deverá ser efetuada até ao termo do prazo estabelecido para a entrega da declaração periódica ou até à data de entrega da mesma, quando esta ocorra fora do prazo.
4.5. - A funcionalidade de validação dos pedidos de autorização prévia relativos às regularizações de IVA por CC independentes encontra-se disponível no Portal da AT.
Legislação conexa:
Este entendimento da Alfisconta não dispensa da consulta da legislação respetiva.